quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Por elas... e por nós! ❤❤❤❤

 "Não quero esta família para nada!" Foram estas as últimas palavras que ouvi ontem, antes de apagar a luz para mais uma noite de normais sobressaltos... quando as paredes brancas do quarto escureceram, depois de dar voltas e voltas na cama, passou-me a mão pelo rosto, afagou-me os cabelos e encostou a minha cabeça ao seu peito, como faz sempre, depois de se acalmar, ponderar sobre o que fez ou disse e sussurrou-me ao ouvido "Eu não queria dizer aquilo, mas estava muito zangada. Eu quero esta família"...
Em silêncio, só para o meu coração ouvir, as lágrimas ganharam vida e ela adormeceu no meu abraço.


A vida não tem sido branda connosco. Entraram para a escola, para um lugar onde tudo era desconhecido - colegas, professores, auxiliares, paredes e espaço exterior. Estão a adaptar-se às pessoas, à rotina, aos trabalhos de casa, ao estudo... à nova realidade. Estão a descobrir quem são num mundo novo, num mundo onde querem encaixar e onde têm de se calar e engolir as lágrimas e os gritos estridentes, onde têm de esconder muito do que são em casa, na casa delas, onde extravasam no final de cada um dos dias em que acumulam aquilo que não podem soltar. E tudo porque as educamos a ser educadas, a respeitar os mais velhos e os seus pares, a comportarem-se segundo os nossos (os meus!) padrões de boa educação. E em casa, quando estamos só as três, naquelas paredes de casa feliz, só ecoam gritos e choro e birras e discussões cada vez mais descontroladas e cheias de uma raiva que não deveria sequer existir no nosso imaginário - a delas por nós, a nossa por elas, a nossa um pelo outro! 

E nesta casa que deveria ser feliz - porque temos tudo para o ser - mora cada vez mais a desilusão, a tristeza e o sofrimento! A mãe que está cansada de tudo o que o dia a dia acarreta e que quando entramos em casa e a porta se fecha deveria deixar os problemas lá fora, leva no bolso tudo o que acumulou durante o dia e explode com as pessoas mais importantes da sua vida. O pai que chega, tarde, com vontade de passar connosco o pouco tempo que o resto do dia permite, ouve, antes de abrir a porta, os gritos que fazem com que qualquer mortal não tenha vontade de entrar. E entra. E zanga-se cada vez mais cedo. E descontrola-se antes de, como fazia antes, poder e ter vontade para apaziguar o desconforto que paira no ar. Estamos a criar estas miúdas num espaço de pressão, de exigência exagerada... e os sorrisos e as brincadeiras e a naturalidade e espontaneidade moram cada vez menos ali!!!! E eram (e são!) tão felizes estas miúdas bonitas que a vida nos ofereceu! Estou a roubar-lhes a alegria inata de uma criança que tem tudo... e não pode fazer nada! Não quero que elas sejam perfeitas, nunca lhes almejei tal destino, mas quero que trabalhem e que se esforcem, que respeitem todos à sua volta e, principalmente, que se respeitem uma à outra! Mas estou a destruí-las, a colocar as suas necessidades em segundo plano... porque sei que o mundo é cruel (e as crianças também!), porque não quero que sofram humilhações e não sejam rebaixadas... e esqueço-me que são pequeninas e que a calma, a paciência, a condescendência, o colo - E O AMOR!!!!! - fazem com o que o processo seja muito mais ligeiro para todos!

E tenho de me lembrar disto todos os dias... quando o pai me chama à atenção para eu acalmar, quando as vejo descontroladas e não consigo controlar esta criança de 43 anos para as conseguir acalmar, para lhes dar o abraço que elas precisam... nunca me disseram que iria ser fácil... mas também nunca ninguém me alertou para o esforço desgastante de criar um filho, dois... ou mais! E elas são as pessoas mais importantes da minha vida e são seres em construção... e as fundições da sua existência não estão a ser construídas com os alicerces necessários. Merda para mim! Mas vou mudar, como aos pouquinhos estou a tentar fazer. Prometo que vou! Por elas e por nós! Prometo que vou!!!!

sexta-feira, 1 de abril de 2022

Aniversário...

Amanhã faço 43 anos! Comprei velas coloridas para enfeitar um bolo que irei fazer com amor, para os amigos que festejarão comigo e apagarei as velas depois de ouvi-los cantar para mim...
Sinto que amanhã faço 60 anos. dói-me o corpo. dói-me a alma. dói-me a pessoa em que me transformei nos últimos anos. Passo os meus dias a tentar ensinar (e a ser ensinada) os filhos de outros pais. passo os meus dias, muitas vezes, a ter de contar até 50 para os meus decibéis não rebentarem janelas e a minha força não cair sobre miúdos que poderiam ser os meus... e gosto muito do que faço! Sinto que contribuo, de alguma forma, para o crescimento destes pequenos seres em formação. e corro entre horas de almoço e finais de dia, para receber um abraço dos pequenos seres que cresceram dentro de mim. e corro em casa para que as noites não se alonguem, para que elas possam ter horas merecidas de descanso... e eu também. e estou tão cheia de tudo o que acumulei durante o dia que rebento ao mínimo estalido que ouça, à mínima contrariedade delas. elas que só querem o abraço e o mimo e a atenção que tiveram de partilhar com outros 20 miúdos pequeninos como elas. e eu poderia ser esse pote de mel no final de cada dia. e no final de cada dia poderia sentar-me com elas no tapete e ser a rainha daquelas princesas, ser a cliente do restaurante que elas gerem e onde confecionam com tanto amor toda a comida de plástico e madeira, com que enfeitam os pratos de todas as cores que habitam aquela cozinha maravilhosa de brincar, ser a senhora que vai fazer rabos de cavalo e prender no cabelo as mais de 500 variedades de ganchos... e ser ali, no nosso recanto, só delas, como elas querem tanto ser só minhas. e olho para o relógio e o tempo não para! e olho para dentro de mim e sinto-me a pior mãe do mundo por colocar o jantar e a roupa e a limpeza à frente de todo aquele amor... e é tão fácil ligar a televisão e servir-lhes uma taça de bolachas para que elas me deixem ter tempo para tudo. e elas ripostam e não querem. querem brincar e se não pode ser comigo, terá de ser uma com a outra... até ouvir gritos e chapadas e queixinhas porque não se entendem nem querem partilhar! E eu, em vez de perceber que elas só estão a pedir atenção, solto o que prendi durante todo o dia e rebento, para todo o lado, em todos os tons! E zango-me! zango-me tanto que sinto que já é o meu estado de espírito mais frequente em todos os dias que passam! E quando as acalmo e as sento à mesa para jantar, chega o pai, que só quer um abraço e um colo e três beijos... e zango-me outra vez porque destabiliza a paz que me deu tanto trabalho alcançar. e zangamo-nos os dois, um com o outro, os dois com elas... e a casa bonita onde só deveriam ecoar gargalhadas estridentes e cantigas que elas decoram na escola e gostam de partilhar, ecoam gritos e discussões e um número infindável de ameaças de castigos que nunca cumprimos! E a hora de deitar é mais uma chamada de atenção para toda a atenção que não tiveram durante o dia... e naquele momento em que nos têm aos dois, disponíveis para elas... volto a zangar-me porque é hora de ler uma história, tranquilamente, no colo de um de nós, deitar e adormecer e sonhar! E isso raramente acontece, porque querem brincar, porque as histórias já não as prendem como quando nos cabiam na mão, porque só querem prolongar aquele momento a 4... como crianças que são! E quando tudo acalma e nos enroscamos nelas até sentir que os sonhos já as embalam, saímos do quarto, pé ante pé e somos só os dois. E o cansaço de todo o dia e do final do dia e do romper da noite leva-nos novamente para longe... e a lareira crepita, a televisão acende-se e o silêncio entre nós volta a irromper... e há sempre tanto para dizer ou haveria, se não houvesse tudo o resto! E tudo o resto é o melhor que temos, o que fizemos e estamos a criar juntos! Nunca estamos totalmente felizes com a vida que temos, pois não? Nunca nos sentimos completos e realizados... e esse sentimento perdura até ao momento em que os nossos olhos se fecham para sempre e a culpa de não termos preservado e esticado todos os minutinhos felizes, nos consome e nos faz partir com arrependimento! 
Lamento sentir que o meu pai partiu assim, há quase 22 anos, sem ter tido tempo de ver tudo o que aconteceu desde aquele dia em que não nos viu mais. E perde-se tanto porque outros valores se interpõem nas nossas vidas, no nosso caminho! E digo constantemente que a vida tem de levar outro rumo, que tenho de me amar mais, me cuidar mais, sem ter de estar constantemente a cuidar das minhas filhas... e falta a coragem, vem o medo de perder algum momento importante e a culpa. Sempre a culpa por sequer ousar em pensar nisso! E elas estariam tão mais felizes (e são!) se eu estivesse bem comigo, se eu fizesse alguma coisa que gosto mesmo! E comecei a escrever este longo texto há 10 minutos e sei e sinto que poderia fazer isto durante dias a fio, sem nunca me cansar! Aqui, neste papel digital, sou eu. Sou a Ana verdadeira e sincera, sem máscaras nem esconderijos. Sou a Ana com os olhos a querer fechar para chorar em silêncio. Sou a Ana frágil e sensível que se liberta por soltar o que reprime para o teclado... sou a Ana que vai fazer 43 anos amanhã. Como se fosse fazer 60. Mas limpei a alma. E já não limpava este pedacinho de mim há tanto tempo! Escrever solta, purifica e rejuvenesce. 
Amanhã faço 43 anos... mas serei sempre a Anita do meu avô Zé! 
E as minhas filhas, que me caibam no colo até que os meus olhos adormeçam da vida para sempre. E que esse para sempre ainda venha longe, muito longe, para as ver crescer!
E o pai delas, que me abrace o peito como no primeiro dia que me abraçou. O meu mundo parou ali. O nosso mundo caminhou, lado a lado, desde esse dia.
Voltarei aos 43!