terça-feira, 5 de setembro de 2023

O vazio da mente... e a alma cheia!


Sinto-me oca. E cansada.
Inúmeras vezes sinto necessidade de ir buscar o computador arrumado num canto para escrever - coisa que sempre me limpou a alma - e depois falta a vontade e a coragem e, sobretudo, as palavras. Como podem as palavras faltar a quem sente que tem tanto para dizer?? Mas faltam... e sobram da minha boca que se abre demasiado para, não raras vezes, dizer o que não deve, mesmo sendo o que o coração sente! O coração numa boca que não se exprime quando deve ou quando pode. Aí, quando nos dizem o que não queremos ouvir (ou não queremos aceitar que seja verdade!), a boca fecha-se, bem fechadinha, como um fecho de correr enferrujado!
Há uns anos que venho prometendo a mim mesma que jamais voltarei a ter um mês inteirinho de férias para me dedicar em exclusivo a elas... e há todos esses anos que isso me esgota, me extenua e me consome. As minhas filhas consomem-me! E quando digo ou penso assim merecia ser esbofeteada, com força! Afinal, elas são o melhor de mim, a minha melhor fatia, os pedaços em que dividi o coração no momento em que nasceram... e deveria querer aproveitar todos os momentos que o tempo me oferece E quero! Mas, quando lhes guardo todo esse tempo, não lhes dou o melhor de mim, porque não cuido da pessoa que as cuida sempre. Não cuido de mim e sinto-me anulada... e, por isso mesmo, uma má mãe!
E quero tanto ser perfeita, almejo tão desmesuradamente a perfeição delas que nos vou destruindo, pouco a pouco.
E sinto-me oca. E cada vez mais cansada.
E no final de cada verão a promessa e o compromisso que assumo comigo é sempre o mesmo: o de cuidar-me mais para poder ter condições para cuidar delas no ano seguinte. E volto à estaca zero!
Terminaram o primeiro ano com boas notas... e para mim não é suficiente! Passaram as férias inteiras sem pegar na pilha de livros que deixei amontoada no canto do quarto de brincar e zanguei-me! Zango-me sempre quando aquilo que idealizo não se concretiza! E defendo com unhas e dentes que as crianças precisam de brincar, de ser criativas, de ser livres... quando se trata dos filhos dos outros! Mas deixo-as brincar e ser livres! Só me dói cada vez mais a falta de ligação que existe entre elas, entre estas gémeas que me parecem diferentes de tantos outros que conheço! Sei o que significa partilhar espaço com irmãos. Cresci a ter de partilhar tudo com duas irmãs com idades muito próximas da minha e a minha mãe enlouquecia muitas vezes por atitudes e comportamentos menos corretos da nossa parte. Mas estas duas, as minhas, estão saturadas uma da outra! Passam o ano inteiro juntas - em casa, na escola, no ATL, na ginástica, na natação, na casa dos avós, na casa dos amigos, em festas de anos... estão constantemente juntas e é notória, cada vez mais, a falta de independência uma da outra, a que é sombra e a que quer estar sempre nas luzes da ribalta! E é notória, cada vez mais, a minha falta de tolerância para com uma e a minha condescendência para com a outra. Sou injusta! E tenho, cada vez mais, vontade de separá-las, para que possam crescer por inteiro, para que possam conhecer o seu próprio espaço e o seu próprio ser. Para que possam ter, cada uma, os seus amigos e manter, se possível for, alguns amigos em comum. E que assim, no final de cada dia, voltem para a casa que é das ambas, para os pais que são das duas, para o abraço que só a elas pertence. Estão cada vez mais desafiadoras, cada vez mais donas dos seus pequenos narizes arrebitados, mais teimosas e dissimuladas, mais espertas que um raio... mais doces e carinhosas! Estão mais tudo... e eu cada vez mais nada....
E sinto-me oca. E exausta...



terça-feira, 11 de abril de 2023

Somos instantes...

..."saudades daquele tempo em que parecia que não tínhamos tempo para nada..."

E tínhamos todo o tempo do mundo, não era? Santa inocência da pré-maternidade... antes de pensarmos sequer em ser mães! Há 9 dias cheguei aos 44 e os dias que antecederam a efeméride foram tensos e tristes... sinto sempre que me estão a roubar vida, estes dias que teimam em correr demasiado rápido como se houvesse pressa para chegar à meta final! Estou perto dos 45, que são um saltinho até aos 50! E isso assusta-me, assusta-me como os 18 e os 30 me assustaram e me deprimiram e me fizeram sentir esmagada por este tempo que não se demora! E agora, mais do que nunca, preciso de tempo, tempo para mim, tempo para nós.... muito tempo para elas! tempo e paciência, calma e braços esticados para as abraçar... e o tempo não estica! E elas já não são pequeninas (apesar de serem), já não me solicitam para tudo (apesar de me chamarem sempre!)... já não precisam tanto de mim (apesar das 500 vezes em que a palavra "mãaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaae" ecoa nas nossas quatro paredes). E amiúde já consigo respirar... e às vezes sinto que não respiro o suficiente.... e às vezes sinto que já não consigo respirar sem tê-las a sugar-me o ar! São estas dualidades que me fazem travar a fundo no precipício que se abre aos meus pés, no decorrer dos dias, quando lhes peço espaço, no cair da noite quando só quero que se enrosquem comigo no sofá para lhes contar histórias que muitas vezes não querem ouvir (mas que já me ajudam a ler!). Tenho saudades de não tê-las... e um pavor crescente do exato momento em que não quererão mais ter-me junto a elas. Em que se esconderão atrás das portas dos seus quartos, num mundo que exigiram só para elas, e me excluam... como eu fiz aos meus pais! Acabamos sempre por afastar aqueles que mais amamos, aqueles de quem mais dependemos, aqueles que nos dão tudo... e a quem é mais fácil fechar do lado de fora da nossa vida! Sofro, sofro sempre muito (demasiado!) por antecipação, talvez por isto mesmo - por saber o que fui e quem magoei, por ter crescido longe e afastada e independente... mas também me conforta saber que, ainda hoje, quando os medos me assombram e os nervos me assolam, o colo da minha mãe está ali, da minha mãe de mãos enrugadas (que me afaga o cabelo como ninguém), da minha mãe a quem a vida roubou tanto e a quem está a fazer envelhecer numa escuridão cada vez mais presente! Sinto tanta, tanta, mas tanta raiva da vida da minha mãe!!! Trabalhou até poder (muito mais tempo do que deveria ter trabalhado!) para que nada nos faltasse! É pai e mãe há mais de 20 anos! E está sozinha, apesar de todos os que tem por perto, entrelaçados nos dedos dela, não tem as mãos daquele a quem jurou amar eternamente! E não é justo! E tem filhas e netos e genros e muitos amigos que gostam incondicionalmente dela e estão sempre a um passinho quando é preciso. Mas nas noites, nas noites em que a luz do sol se esvanece e a escuridão lhe irrompe pela casa... o silêncio que a abraça sem lhe tocar, a voz que lhe sussurra sem se deixar ouvir...  sei que adormece sempre triste, a minha mãe. Triste pela casa vazia, triste pelos olhos que lhe estão a morrer... e o que peço a esta vida, é que lhe conserve a pouca luz que ainda vê para que possa ver os netos crescer e a ter aquela energia para ainda inventar jogos e brincadeiras que os fazem felizes! 
E não era este o rumo que queria dar à minha "aparição" nestas páginas brancas... mas são todos estes pedaços de mim que me fazem olhar para o lado de lá da ponte com medo, com receio de atravessar. Temo que do outro lado os degraus me fujam e me façam cair... e me tirem o chão! Somos instantes...

(foto bonita de dias bonitos com a mão que não se desprende da minha*)